Neural Decoding Using Machine Learning

Durante anos o genoma era o código de maior interesse da humanidade. Era o texto sagrado, sem especialista algum, e um alfabeto de apenas 4 letras, que fazem parte do DNA e RNA, e orquestra todas as funcionalidades dos organismos. O início da solução do mistério começou em 50 e hoje já parece ser “entendido” e manipulável. Com ajuda da bioinformática, quando utilizamos algoritmos para manipular dados biológicos, novos tipos de RNAs foram descobertos e suas formas de expressão e regulação já são minimamente compreendidas. O avanço da ciência permitiu a aplicação da engenharia genética em plantas, animais e até no próprio ser humano… O que leva a discussões agora muito mais éticas do que tecnológicas, que de toda forma, ainda têm muito a fazer.

Nos últimos anos, um novo código vem recebendo grande atenção no mundo, o sistema de comunicação utilizado pelos neurônios para orquestrar, em um diferente nível funcional, as atividades dos organismos. Foi levado à tona por causa da Realidade Virtual, Internet das Coisas e todas as possibilidades trazidas pelas dezenas de filmes de ficção futuristas. Com isso, naturalmente, a inteligência artificial termina contribuindo com mais uma área, a neurociências, quando tenta entender o padrão de atividade dos neurônios diante de uma estímulo, para tentar prever a atuação a partir dessas sensações. Desde 2016, em parceira com pesquisadores do Instituto Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra (IIN-ELS), orientamos 4 alunos de gradução, organizamos eventos e seguimos agora com projetos no CNPq aprovados e novos alunos em novas pesquisas. No primeiro deles, o TCC do aluno laureado Andy Gajadhar, vindo do Ciências sem Fronteiras nos EUA, onde teve oportunidade de conhecer a área, começamos a parceria com o IIN-ELS e os pesquisadores André Salles, Renan Moioli e Carol Kunicki.

Nesse trabalho propusemos um método para decodificação neural aplicada a um experimento de discriminação tátil ativa envolvendo roedores utilizando uma abordagem de aprendizagem de máquina, mais especificamente, utilizando o algoritmo máquina de vetor de suporte (do inglês, Support Vector Machine, SVM). Os testes executados em nove ratos mostraram a eficácia do uso de aprendizagem de máquina para decodificação neural, resultando em uma acurácia mínima de 95% sem seleção de atributo e de 93% com seleção de atributo (quando usamos apenas 30 neurônios para prever a ação do rato). Foram identificados os neurônios e regiões do cérebro mais importantes na realização da tarefa.

O que mais surpreendeu no trabalho foi o fato dos nove ratos apresentarem comportamentos neuronais bem diferentes uns dos outros mesmo realizando a mesma tarefa, identificar o lado correto onde estava a recompensa em uma caixa cega, a partir do estímulo fornecido que correspondia a largura de uma porta. Por exemplo, porta larga, recompensa do lado direito. Foi uma das primeiras e mais interessantes coisas que aprendi quando comecei a trabalhar com neurociências. Cada animal ativa regiões diferentes do cérebro, principalmente, porque cada um vive experiências de forma única. É como se quiséssemos um dia prever o que alguém estivesse pensando… Bastaria treinar um modelo baseado na forma como mil pessoas pensam e generalizar para qualquer outra?? Se você durante sua infância criasse um jacaré e fosse super ligado a ele e seu melhor amigo tivesse sido mordido pelo mesmo animal, as mesmas regiões do cérebro estariam ativadas na presença dele???

A inteligência artificial, a neurociências e a bioinformática mostram-me diariamente a ver o mundo como infinitos universos únicos. Talvez seja a mais racional forma de viver a empatia, entendendo que não apenas somos diferentes fenotípico e geneticamente, mas que essas diferenças vão além em como nossas moléculas interagem e como nossos neurônios “conversam” mesmo em cenários completamente similares. Entender isso é compreender como a IA ainda tem muito a crescer.

https://www.researchgate.net/publication/328401769_Neural_decoding_with_SVM_and_feature_selection_in_a_rat_active_tactile_discrimination_task